A compra

E então consultei minhas fontes (financeiras). Como sempre costumo dizer, financiamento bom é aquele que você consegue pagar sem se apertar – independente do valor final da coisa. E consegui algo nesse sentido. Liguei pro celular do caboclo e, num primeiro momento, ele não atendeu. Mas me retornou logo em seguida. A cobrar. Paciência, fazer o quê? O interessado era eu.

– E aí? Vamos bater o martelo?

– Ôpa!

– Mas vamos fazer o seguinte: só arranja um pedal de acelerador pra ele, tá? Pode até ser usado mesmo…

– Xácomigo!

Pois é. Havia esquecido de lhes contar esse detalhe acerca do acelerador…

Mas tudo bem. Combinamos que ele levaria o carro às sete da noite para minha casa. Já deixei preparado um contratinho de compra e venda (advogado é advogado, não adianta), e tomei o cuidado de verificar no Detran a situação de multas do carro. A bem da verdade, foi só depois de muita insistência dos amigos Milena e Evandro que fiz isso (taurino é taurino, não adianta).

Liguei pro Evandro:

– Evandro?

– Chora.

– Que é que você acha da idéia de dar uma passada lá em casa hoje? Pra dar uma olhada no carro, sabe como é. Podia aproveitar e jantar por lá…

– COVARDE! Você não quer é estar sozinho pra levar uma guasca da Dona Patroa quando o cara entregar o carro!

– Hmmm… É.

– Tá bom. Seis e meia a gente sai, então.

– Beleza.

Eis que chegamos em casa e comecei um proseio com a Dona Patroa. Papo vai, papo vem, e aí, como foi seu dia, foi bem, e o seu, muita correria, eu também, o cartório tá uma loucura, muitos processos, nem me fale, tô com uma pilha enorme, a propósito, comprei um carro, o cara vem trazer daqui a pouco, e as crianças, será que deram trabalho… PÉRAÊ!!!

Glup.

– Não, pois é, então. Lembra que eu tinha falado do carro que vi ontem? Fechei negócio…

– Não a-cre-di-to.

– Não, olha só… Aliás, acabou de chegar! Deixa eu ir lá atender o portão.

E desci as escadas para a garagem, deixando o Evandro (gargalhando) e a Dona Patroa (bufando) para trás. Cumprimentei o rapaz, convidando-o para subir e acertarmos os papéis. Nesse meio tempo o Evandro desceu e, quando já estávamos entrando, ele comentou com o ainda dono do carro:

– Escuta, acho que é melhor não deixar a chave no contato não, hein!

O rapaz bateu com as mãos nos bolsos e, em seguida, espalmou com violência a testa.

– Putaqueopariu! Tranquei a chave dentro do carro!

Foi nesse momento, mais pela visão periférica que qualquer outra coisa, que percebi que a Dona Patroa (com um ar resignado) nos deixava ali pra resolver o problema, tendo entrado em casa balançando lenta e negativamente a cabeça.

Com algum trabalho foi possível abaixar o vidro traseiro (que estava com uma chave de fenda prendendo-o) e abrir com estrondo a porta do passageiro (a coluna de sustentação da porta estava bem meio bichada). Assinamos os papéis, preenchi o cheque e ficou acertada a entrega do recibo já autenticado assim que o dinheiro estivesse liberado.

Muito bem, agora era só guardar o bichão em casa.

E quem disse que eu consegui engatar a ré do infeliz?

Tenta de um jeito, tenta de outro, aperta prum lado, aperta pro outro, vai, volta, e nada. Aí eu disse pra mim mesmo: “Mim mesmo, é melhor a gente se preocupar com isso depois”. Engatei a primeira, fiz um balão lá na esquina e entrei de frente mesmo na garagem.

Pouco depois o Evandro foi embora (após ter passado o perigo) e, apesar do olhar cético da Dona Patroa, trouxe a criançada pra garagem pra ver o “carro novo” do papai. Deixei-os tempo suficiente para se divertirem dentro do enorme playground que é um Opala.

Passei cerca de uma hora fuçando na Internet buscando algum manual do carro pra entender um pouquinho mais esse trem doido que tinha acabado de comprar. Consegui encontrar um do modelo de 1978 (deve servir) e dei uma lida. Ah, sim, agora entendi. Para engatar ré primeiro tem que se puxar para cima a alavanca do câmbio e então trazer para esquerda e para trás.

Solucionado o problema, finalmente fui dormir.

O alívio e a alegria vieram com a última frase da Dona Patroa naquele dia:

– E então? Está feliz com seu brinquedo novo?

Parece que finalmente ela havia entendido…

Eis o Opalão!

6 comentários em “A compra”

  1. hehehehe Quando comprei o meu, pela bagatela de R$ 1.000,00, quase fui linxado e escurraçado!! Mas como deixar um pobre Opala padecendo na rua, me olhando todo dia na ida e na volta do trabalho? A sorte é q sabia como dar a ré, pois ele estava estacionado a poucos metros da minha garagem e seu estado não era dos melhores para andar, nem que fossem 10 metros…

  2. Talvez uma das melhores definições que eu já tenha lido para um Opala é aquela que encontrei num grupo lá do Orkut: Opala: – Alguns não gostam, muitos criticam, poucos os têm, MAS TODOS RESPEITAM!

  3. Gosto é gosto e não se fala mais nisso, parabéns pelo seu.
    Tenho um opala ano 89 ou melhor neguinho, já fui criticado muitas vezes para vende-lo motivo vira e mexe frequenta o médico, mas vc sabe como que é primeiro carro é que nem a primeira paixão nunca esquece.Fica com Deus e parabéns pela divulgação na net….

  4. Obrigado, Ademilson! Independentemente de se tratar ou não de Opala, por experiência própria, QUALQUER CARRO VELHO é vítima de críticas como essa. Cansei de ouvir o povo dizendo “Por que você não vende esse troço?”, “Passa pra frente, pois só dá dor de cabeça!” e outras frases do gênero. E nem era com relação ao Opala, mas sim um Fusca e, depois, uma Marajó!

    Mas o que eu já ouvi no tocante ao Opala chega a ser impublicável…

  5. Olá pessoal,

    Eu to vendo essas histórias aqui e rindo dos comentários. Eu estou me preparando emocionalmente para passar por isso também, visto que tenho 4 mulheres em casa, mulher e filhas(todas adolescentes), todas gostam de carros novos. Imaginem como vai ser a recepção de um opala na garagem aqui de casa?
    Minha mãe também já deu a opinião dela:”Onde você vai por essa lata velha?” Você tem que comprar é um carro zero.
    Enfim, assim que conseguir postarei aqui o que aconteceu. Abraço e parabéns pela iniciativa, muito bom seu site.

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