Internética

( Publicado originalmente em meu antigo domínio “HABEASDATA”, em julho/2000 )

INTERNET – SITE SOB O TÍTULO “SOLUÇÕES ON-LINE PARA PROBLEMAS COM A LEI” – CONSULTA DA SECCIONAL DE SANTA CATARINA

Processo n. E-2.192/00
Relatora – Dra. ROSELI PRÍNCIPE THOMÉ
Revisor – Dr. JOÃO TEIXEIRA GRANDE
Presidente – Dr. ROBISON BARONI
Julgamento – 27/07/00 – v.u.

RELATÓRIO

A presente consulta é formulada pelo D. Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional de Santa Catarina.

Relata que no Jornal Gazeta Mercantil, de 09.06.00, houve uma matéria publicada sob o título “Soluções on-line para problemas com a lei” (fls.05).

Entende o nobre presidente daquele Sodalício “que a criação de portais como exposto no aludido artigo afronta o Código de Ética e Disciplina, arts. 28 a 33 (CAP. IV), que trata da PUBLICIDADE”.

Diz mais.

“O advogado que vier a associar-se a empresas similares a UNIJURIS, como consta da matéria, estarão sem sobra de dúvida utilizando de anúncio ostensivo, via internet as devidas proporções, os anúncios em jornais, revistas, rádios e televisão”.

“Logo, mesmo não estando inserido no capítulo da publicidade retro mencionada tal tipo de divulgação de serviço, é notório que configura-se violação ao mesmo”.

Solicita posicionamento a respeito, orientando as Seccionais.

É o relatório.

PARECER

Com toda razão o nobre Consulente, quando afirma que os “sites” constantes da matéria veiculada em jornal de grande circulação ferem o Código de Ética e Disciplina.

Li e reli a matéria, sublinhando dados importantíssimos, dela constando:

“O Unijuris surgiu da associação entre o advogado João Carlos Kurtz, ex-procurador do Estado de Santa Catarina, e a Paradigma, empresa especializada em sistemas para comércio eletrônico”.

“Em fase mais embrionária está a Digesto.net, também em Florianópolis. Segundo um de seus criadores Hugo Hoeschi, procurador nacional em Santa Catarina, o foco do site é ajudar as pessoas comuns a obter serviços jurídicos de forma mais descomplicada”.

É assombrosa a notícia, vez que trata-se, com certeza de matéria publicitária, com “serviços” destinados a um número absurdo de pessoas, por advogados, que ainda prestaram ou prestam serviços a órgãos públicos.

É assustador tomar conhecimento de uma situação tão constrangedora, que tanto denigre a nobre profissão do advogado.

A gama de infrações éticas que vem sendo praticadas pelos advogados é tão grande, que irei por diferenciá-los.

A primeira, diz respeito à própria matéria em si, consoante preceitua o artigo 32 do Código de Ética e Disciplina, que diz:

“O advogado que eventualmente participar de programa de televisão ou rádio, ou de entrevista na imprensa, de reportagem televisionada, ou de qualquer outro meio, para manifestação profissional, deve visar objetivos exclusivamente ilustrativos, sem propósito de promoção pessoal ou profissional, vedados os pronunciamentos sobre métodos de trabalhos usados por seus colegas de profissão.

Parágrafo único. Quando convidado para manifestação pública, por qualquer modo e forma, visando ao esclarecimento de tema jurídico de interesse geral, deve o advogado evitar insinuações a promoção pessoal ou profissional, bem como o debate de caráter sensacionalista”.

A segunda refere-se à publicidade imoderada.

A publicidade do advogado vem perfeitamente delineada nos artigos 28 e seguintes do Código de Ética e Disciplina.

Este Tribunal tem decidido, sempre de forma unânime, que com relação à internet, existe a possibilidade de anúncio, mas nos moldes do artigo 29 do Código de Ética e Disciplina, fazendo constar o nome completo do advogado e o número da inscrição na OAB, referências a títulos ou qualificações profissionais, especializações técnico-científica e associações culturais e científicas, endereços, horários de expediente e meios de comunicação, vedada a utilização de nome fantasia.

Nada mais.

O além de tal determinação, configura clara infração ética.

A terceira é a clara e evidente captação de clientela.

Estes serviços de orientação jurídica, tanto pela internet, quanto pela linha 900, ou mesmo serviço de Bip, configuram patente angariação de clientes.

Isto porque, como já afirmado, o número de pessoas que terá acesso aos indigitados “sites” são totalmente imprevisíveis, implicando, destarte, na mercantilização da profissão do advogado.

E não é só.

Imagino as situações aqui existentes e relatadas de total ausência de compromisso, de sigilo, de confiança, imprescindíveis à nossa atividade.

Orientando as seccionais, conforme elucida o nobre Consulente, entendo que cabe aqui de imediato a aplicação do artigo 48 do Código de Ética e Disciplina, que afirma:

“Sempre que tenha conhecimento de transgressão das normas deste Código, do Estatuto, do Regulamento Geral e dos Provimentos, o Presidente do Conselho Seccional, da Subsecção, ou do Tribunal de Ética e Disciplina deve chamar a atenção do responsável para o dispositivo violado, sem prejuízo da instauração do competente procedimento para apuração das infrações e aplicação das penalidades cominadas”.

Então o presidente da seccional Consulente poderá oficiar aos advogados constantes da matéria, para que cessem imediatamente o “site”, sem prejuízo de determinar a instauração do processo disciplinar competente.

O nobre Presidente deste Tribunal de Ética e Disciplina I, na sua obra Cartilha da Ética Profissional do Advogado, 3ª Edição, LTr, ensina:

“O grande trabalho é fazer com que as pessoas entendam que princípios éticos são regras básicas para a tomada de decisões, em quaisquer situações, com ou sem a presença de alguém, e não fatores a serem considerados, como é difundido, principalmente no campo mercadológico.

Há de se ter em mente que é aceitável perder; na realidade, é preferível perder a mentir, roubar, lograr, insinuar, dissimular, etc. Assim, as pessoas que por si, por costume ou formação, não estão dispostas a perder, certamente estarão propensas a fazer tudo o necessário para ganhar, ou levar vantagem em todas as situações”.

Estes não interessam à nobre classe.

Interessam-nos aqueles que tendo conduta ética enobreçam a nossa profissão.

É o parecer que submeto aos nobres pares.

EMENTA

INTERNET – SITE SOB O TÍTULO “SOLUÇÕES ON-LINE PARA PROBLEMAS COM A LEI” – CONSULTA DA SECCIONAL DE SANTA CATARINA – O Código de Ética e Disciplina da OAB não veda ao advogado o simples anúncio informativo, mas a propaganda indiscriminada, com oferta de soluções para problemas jurídicos. A oferta de serviços jurídicos, como solução on-line para problemas com a Lei, extrapola os princípios da discrição e moderação que devem nortear a conduta profissional, além de ferir os princípios da pessoalidade e da confiança que devem emergir da relação cliente/advogado. A matéria veiculada em jornal de grande circulação demonstra que deixaram de ser observadas as regras contidas nos artigos 7º, 28, 29 e 32, dentre outros, do Código de Ética e Disciplina. O consulente poderá tomar todas as providências preconizadas pelo art. 48 do CED, oficiando aos infratores para que cessem de imediato a prática, sem prejuízo da instauraçào de procedimento disciplinar. v.u. do parecer e ementa da Rel.ª Dr.ª ROSELI PRÍNCIPE THOMÉ – Rev. Dr. JOÃO TEIXEIRA GRANDE – Presidente Dr. ROBISON BARONI – 27/07/00.

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