Veredas da Vida – IV

O Início na Administração Pública

Perguntar-me-iam vocês: por que se demitir de um lugar com um salário bom e, sobretudo, com carteira assinada? Responder-lhes-ia eu: porque, apesar de tudo, ainda assim eu poderia ser mandado embora a qualquer momento. Afinal de contas, já havia acontecido antes. O registro em carteira certamente garantia direitos, mas não garantia estabilidade. E, apesar do bom trabalho lá n’O Valeparaibano, na minha cabeça, depois de tudo que eu já havia passado, era necessário ter algum tipo de estabilidade. Por esse motivo eu vinha prestando concursos a torto e a direito, até que finalmente passei em um.

Em 15 de junho de 92 foi anotado na minha carteira de trabalho o início de meu contrato na Prefeitura Municipal de São José dos Campos, no cargo efetivo de Assistente Administrativo. Sim, na época o regime ainda era celetista (regido pela Consolidação das Leis do Trabalho). Era o último ano de governo do então prefeito Pedro Yves Simão e eu fui designado para trabalhar na Secretaria de Planejamento, cujo secretário à época era o sr. Salviano. De cara já passei a fazer parte do CAMPE – Comitê de Apoio à Micro e Pequena Empresa; não ganhava nada a mais com isso, mas era divertido trabalhar com o aspirante a artista Romeu Lepiani e o militar reformado Ítalo Casoni. Isso sem nem falar no resto da turma de arquitetos, sendo de se destacar a sempre querida Rossana e o divertidíssimo Paolo… Pouco mais de um mês após meu início na Prefeitura foi aprovada a Lei Complementar nº 56, de 24 de julho de 1992, que estabeleceu o regime estatutário para todos os servidores públicos do Município. Por conta disso na minha carteira de trabalho a baixa foi dada em 21 de dezembro de 92 – ainda que eu continuasse trabalhando.

Meu local de trabalho era no próprio Paço Municipal, uma construção estranha, um caixotão de dez andares (sete pra cima, três pra baixo), cujo ar condicionado de vez em quando pifava e éramos todos obrigados a evacuar o prédio, pois não era possível abrir NENHUMA janela, já que todas eram seladas. Bicho fuçador que sou, conhecia praticamente todos os andares, assim como o povo que trabalhava por ali. Foi um local onde passamos por muitos bons momentos, assim como por muitos perrengues também. E foi lá que acompanhamos, voto a voto, o impeachment do Collor, no final de 92…

Aliás, de quando em quando o Fundo do Vale (como é chamado o local onde fica a Prefeitura) alagava completamente e o terceiro subsolo do Paço ficava totalmente inundado, assim como os carros que estivessem lá no momento. Isso se dava graças à canalização do córrego – ou seria ribeirão? – Vidoca, que, se não me engano, começou com o Ednardo enquanto Prefeito (correu atrás de um convênio para canalizar, o que seria concluído pelo seu sucessor) e terminou com o Ednardo enquanto Vice Prefeito (reabriu o que não deveria ter fechado)…


Não, o prédio não era azul e amarelo na época…

Teve início o ano de 93 e, com ele, uma nova Administração Municipal, com a prefeita eleita Ângela Moraes Guadagnin. Período conturbado, logo no início, com greve de servidores e o escambau! Apesar dos pesares, da busca pela estabilidade, o salário já não estava mais dando conta, graças a uma inflação que se mantinha firme em torno de 25% ao mês!

Mais uma vez tive que rever meus conceitos e decidi que seria menos pior um trabalho que pagasse mais, ainda que às custas de meu cargo efetivo. Conversei com o pessoal com quem trabalhava e eles, obviamente, acharam que era a ideia mais idiota da face da Terra. Mas sou taurino e, bem, já sabem, né? No início de fevereiro entreguei a documentação necessária no Departamento de Recursos Humanos e fui trabalhar numa marcenaria, mais uma vez no cargo de Serviços Gerais, cuidando de toda a parte administrativa e de atendimento, bem como, de quebra, também desenhando e projetando móveis embutidos sob medida. Não era feliz, sentia falta da Prefeitura, mas a remuneração era melhor. Durou apenas duas semanas.

Isso porque, lá na Prefeitura, deram um jeito de resgatar minha documentação no RH antes que dessem baixa e conseguiram me realocar para um cargo comissionado, cujo salário era um pouco melhor que o meu de origem: Assistente Técnico II (devidamente nomeado através da Portaria nº 266, de 16 de fevereiro de 1993). O CAMPE havia sido extinto junto com o governo anterior e eu passei a desempenhar minhas novas funções na biblioteca da Secretaria de Planejamento: de um lado eu era o responsável pelo controle do orçamento da secretaria (cujo secretário agora era o sr. Edmundo, então Vice-Prefeito) e, complementarmente, ficou aos meus cuidados a organização de toda a documentação que viria a se tornar o primeiro Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado da cidade de São José dos Campos.

Foram mais de 300 laudas feitas sabem em quê? Word 5.0 for DOS! Mas o pior mesmo foi a compilação de todo o material, que chegava via disquete (pendrives ainda não existiam e gravadores de CDs eram um luxo caro demais para se ter), impressos e até mesmo manuscritos. E o que vinha nos disquetes possuía os mais diversos formatos: WordStar, Word 2, arquivos TXT e outros que não eram possíveis de abrir e voltavam para que a origem o “consertasse” e encaminhasse novamente. Não fiquei na Prefeitura tempo suficiente para acompanhar a conclusão do projeto e outros viriam a me substituir naquela tarefa, mas ao menos (orgulho besta…), quando da edição final e impressão do Plano Diretor, meu nome esteve presente, encabeçando a equipe de digitação!

E como não descobri nenhuma foto dessa época, então, só pra constar: bem lá do nosso jeito, ainda continuávamos bem casadinhos…


Levando…

E mesmo assim, após pouco mais de um ano na Prefeitura, metade desse tempo numa Administração, metade noutra, mais uma vez pedi demissão e, conforme Portaria nº 1557/93, fui exonerado em 31 de agosto de 93.

Difícil ficar quieto num canto, né?

(Continua…)

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