Um momento de ternura

Invariavelmente tenho o costume de, após o café da manhã, ir para a varanda para tomar um “café preto” e soltar umas baforadas. Como a casa foi construída acompanhando um morro, então tenho a garagem no nível da rua e, em cima, uma varanda com uma mureta para me recostar e acompanhar o movimento dos carros, dos pedestres, das bicicletas, dos caminhantes e outros quetais.

Temos duas árvores defronte, uma grande, com 18 anos (sei disso porque plantei-a logo após o nascimento de meu caçula) e outra pequena, resquício de uma anterior que caiu sozinha de velhice, fungos e podreira.

Na árvore maior, enganchada numa de suas forquilhas mais baixas, uma latinha de cerveja. “Que raios! E nem fui eu que tomei.” Ali mesmo já pensei em, após terminar meu café, descer, recolhê-la e colocá-la junto com o restante do lixo reciclável.

Mas eis que, antes disso, me surgiu de passagem um caboclo em andrajos, carregando duas madeiras num ombro e com a outra mão, quase que arrastando, um saco cheio de latinhas de alumínio. Bem, do ponto onde fico os transeuntes não têm ideia que estão sendo observados, de modo que fiquei aguardando se ele iria ver e recolher a bendita da latinha.

Mas ele vinha cabisbaixo, não que procurando por algo, mas simples com um evidente ar de desalento. E passou reto. “Bem, paciência. Daqui a pouco eu mesmo desço e recolho a bendita da latinha.” Mas eis que o sujeito para e fica acocorado, observando alguma coisa no chão. Cutuca o que quer que seja que estivesse cutucando e fica observando.

“Uai?…”, pensei.

Então, com nítido cuidado, ele pega seu objeto de observação e volta para a árvore em frente de casa. Daí eu pude ver o que estava em sua mão: uma cigarra. Com delicadeza ele estica o braço e a acomoda no tronco da árvore. Só então percebe a latinha ali enroscada. Dá um sorriso, arranca a latinha da forquilha, enfia no saco, se certifica que a cigarra está bem acomodada (talvez intimamente agradecendo a sorte por tê-la encontrado e lhe feito encontrar mais uma latinha) e vai embora cantarolando baixinho uma canção que não consegui identificar.

Embevecido, por esse momento de ternura, não pude deixar de sorrir.

Taí um sujeito castigado pela vida, numa fria manhã de domingo, de bermuda e chinelo de dedo, procurando “tesouros” no meio do lixo alheio para sua própria sobrevivência. Ainda assim, diante de um ser ainda mais frágil, que no meio da calçada poderia ser pisoteado a qualquer momento por um caminhante desavisado (e que provavelmente ainda iria se indignar por ter sujado a sola do calçado), esse rapaz tem a preocupação de resgatá-lo e devolvê-lo para seu próprio meio, para viver sua própria vida, longe daqueles que poderiam feri-lo.

Penso comigo se ele mesmo não gostaria de também receber esse tipo de tratamento…

Isto é, na atual sociedade ele está ali, frágil, na calçada do viver, podendo a qualquer momento ser pisoteado e esmagado pela falta de condições mínimas de sobrevivência. Alimento. Saúde. Abrigo.

E mesmo assim teve humanidade suficiente para se preocupar com quem está em situação ainda mais frágil que a sua própria!

Pois é. Quando falamos em políticas públicas em prol da sociedade, diferente do que pensam alguns (idiotas), não é “ficar dando condições pra vagabundo”, mas sim paea dar condições mínimas de subsistência para que os mais desafortunados possam ter, no mínimo, a oportunidade de ascender e disputar em igualdade de condições vagas de estudo e de trabalho com aqueles que não precisam ter essa diuturna preocupação com sua própria sobrevivência.

Mas como fazer isso se não tiver o que comer?

Mas como fazer isso se não tiver saúde?

Mas como fazer isso se não tiver onde morar?

E não, este não é um “texto político” (apesar de que a vida em sociedade, em si mesma, é política), mas simplesmente meras reflexões e divagações deste Velho Causídico que vos tecla diante de uma situação que acabei de presenciar. Sinceramente não me importaria se o partido A, B ou C estivesse no poder, ou se o governante fosse fulano ou beltrano. Desde que quem estivesse à frente da nação tenha um mínimo de solidariedade, compaixão e até mesmo de misericórdia para olhar por este povo que (sobre)vive em precárias condições, estaria tudo bem. Mas, diante do recente caos político que passamos, incomodou-me sim – e muito – toda a óbvia cortina de fumaça lançada para deixar a Casa Grande cada vez mais intocável e distante da Senzala. Mas, queira Deus, esse reinado cruel está próximo do fim.

E quando eu falo de “solidariedade, compaixão e misericórdia” entendam que não é meramente uma questão política. E muito menos religiosa. Até porque, na minha nada humilde opinião, religião e política deveriam obrigatoriamente trilhar caminhos separados. É uma questão de humanidade.

Aliás, recentemente o Padre Julio Lancellotti disse algo muito interessante: “A solidariedade, a compaixão, a misericórdia, a empatia não são dimensões religiosas, são dimensões humanas. Até porque os ateus também podem ser compassivos, misericordiosos e os que não têm religião, também.”

Enfim, meus caros, todo esse devaneio dominguístico-matinal surgiu tão somente porque tive olhos para ver (e enxergar) um momento de humanidade de alguém para outro alguém que sequer humano era.

E acho que é isso que anda faltando em nossa sociedade.

Humanidade.

Votos nulos e em branco não anulam a eleição

E já que as eleições se aproximam, vamos agora a mais um serviço público prestado por este Velho Causídico em prol da informação clara e correta….

Ao contrário do que muita gente pensa, os votos em branco e os nulos não interferem no processo de apuração e não anulam uma eleição

Fonte: Tribunal Superior Eleitoral

A cada eleição, um bombardeio de informações falsas e já refutadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) chega até o eleitor pelos diversos meios de comunicação existentes atualmente. Por isso, é necessário saber o que é fato ou boato por meio de fontes seguras. Para começar, é importante entender que os votos em branco e os nulos não possuem valor algum. Eles são descartados do processo de apuração e considerados apenas como estatística.

Regra

Vale lembrar que a Constituição brasileira é que estabelece as “regras do jogo”. E nela está escrito que o candidato eleito é aquele que obtiver a maioria dos votos válidos, excluídos os em branco e os nulos, que são considerados inválidos. Portanto, apenas os votos válidos, aqueles destinados a um candidato ou a um partido, entram na contagem.

Fato ou Boato?

Os votos para cada cargo são independentes. Se o eleitor votar apenas para presidente da República e optar por votar em branco para os outros cargos, o voto para presidente vai valer do mesmo jeito. Muitas fake news afirmam que, neste mesmo exemplo, o voto para presidente deste eleitor seria anulado, pois seria considerado um “voto parcial”. Mas isso simplesmente não existe.

Um dos principais mitos do processo eleitoral se refere a uma suposta interferência dos votos em branco e dos nulos no resultado da eleição. Como são considerados inválidos, esses votos em nada interferem, tampouco beneficiam quaisquer candidatos. Isso não passa de um boato.

Mais um mito

Se a maioria dos eleitores anular o voto ou votar em branco, a eleição inteira deve ser anulada? A resposta é não. Muitos já receberam essa falsa informação, porém o caso é o mesmo do item anterior. Apenas os votos válidos são considerados no pleito.

Essa desinformação que, vira e mexe, volta a circular nas redes sociais e nos aplicativos de mensagens, afirma que, segundo o artigo 224 do Código Eleitoral (Lei nº 4.737/1965), se mais de 50% dos votos de uma eleição forem nulos, o pleito deverá ser anulado.

No entanto, na verdade, o dispositivo prevê a necessidade de marcação de nova eleição se a nulidade atingir mais de metade dos votos do país em decorrência da constatação, pela Justiça Eleitoral, de fraude no pleito, como, por exemplo, eventual cassação de candidato eleito condenado por compra de votos. Todos esses falsos conteúdos já foram desmentidos várias vezes pelo TSE, por outros órgãos da Justiça Eleitoral e por veículos de comunicação de credibilidade, além de agências de checagem.

Por isso, para votar consciente, não caia na desinformação e consulte fontes confiáveis.

Sobre política e idiotas

Uma das contas que sigo lá no Instagram é o Questão de Linguagem (@instagram.com/qlinguagem), criada por um professor de português e com dicas e curiosidades muito legais. Uma das mais recentes foi a seguinte:

“Você sabe qual é a relação entre as palavras “idiota” e “política”? Os gregos antigos inventaram muitas coisas, ideias e conceitos que a gente usa até hoje. Uma das principais invenções deles foi a “pólis”. A gente pode traduzir “pólis” por “cidade”, mas era uma cidade com mais autonomia que as de hoje, uma organização social constituída de cidadãos livres, que discutiam e elaboravam as leis. Tudo que dizia respeito à “pólis”, formava a “polítika”. Portanto a política era de interesse de todo cidadão, embora nem todo cidadão se interessasse por ela. Naquele tempo havia algumas pessoas que não se preocupavam com os outros cidadãos da “pólis”, eram egoístas, só desejavam saber de si mesmos, não se interessavam por política. Os gregos chamavam que não queria participar da política de “idiotes” [idiotas], que queria dizer, literalmente, habitante de si mesmo, morador de si próprio.

Bicho desconfiado que sou, ainda assim fui dar mais uma fuçada na Internet e encontrei lá no Dicionário Oxford:

ETIM gr. idiotes: indivíduo particular (em oposição a homem do Estado), cidadão plebeu; ignorante, sem educação, pelo lat. idiota,ae: pessoa sem instrução, ignorante, tolo

Pois é

Pelo quadro político brasileiro hoje, qualquer coincidência é mera semelhança…

Os Doze Mandamentos do Esquerdista Moreno

Estes “Doze Mandamentos” vieram lá do blog/site/portal da Socialista Morena, da Cynara Menezes. Já os comentários irrelevantes que os seguem são de minha autoria mesmo. Porém é preciso contextualizar o porquê desse título, e ninguém melhor que a própria autora para explicar.

“”Darcy e Leonel Brizola voltaram do exílio falando num socialismo que não seguisse os modelos de nenhum país: nem da URSS nem da Alemanha Oriental nem de Cuba nem do Chile nem do Vietnã nem de nenhuma parte. Seria um socialismo à brasileira, aqui nascido e com nossas características de nação mestiça, morena. Daí o termo “socialismo moreno”. Ambos sofreram brutais ataques da mídia comercial apenas por utilizar estas palavras e sempre lamentei que tenham deixado a ideia de lado sem se aprofundar teoricamente sobre o socialismo que queriam.”

Agora à bricolagem do dia:

I – Não ter o dinheiro como norte (Não tenho. Nem como Norte, Sul, Leste ou Oeste. Simplesmente não tenho. Dinheiro.)

II – Respeitar o próximo como a ti mesmo (não precisa nem amar, respeitar tá de bom tamanho) (Eu bem que tento. O problema é que sou desrespeitoso para comigo mesmo…)

III – Não roubar o povo (Aliás não roubar. Simples assim.)

IV – Ser pacifista (violência, só contra a tirania) (Me mostre onde tem violência, qualquer que seja, e basta me procurar na direção contrária.)

V – Amar a natureza (Amo. Principalmente a feminina.)

VI – Ser contra o latifúndio, os transgênicos e o uso abusivo de agrotóxicos (Big Mac pode?)

VII – Não perder a capacidade de se indignar (Só de pensar nisso já fico indignado.)

VIII – Acreditar e lutar por direitos iguais para todos, independentemente de raça, credo, origem, condição social ou orientação sexual (Aqui não tem gracinha, pois essa bagaça é séria. E concordo plenamente, em gênero, número e grau.)

IX – Ser consciente da dívida histórica com indígenas e negros e apoiar políticas de ação afirmativa (E os amarelos? Afinal de contas a Dona Patroa é japinha…)

X – Ser um defensor intransigente da liberdade: de pensamento, de expressão, de culto, de ir e vir, cognitiva (Comecei concordando, mas confesso, sem nenhuma vergonha, que tive que consultar o dicionário: “A liberdade cognitiva , ou o direito à autodeterminação mental, faz parte dos direitos e liberdades de controlar sua própria cognição e consciência. Tem-se argumentado que isso é tanto uma extensão quanto o princípio subjacente da liberdade de pensamento.” Entenderam? Então.)

XI – Ser a favor do estado laico (Sim, graças a Deus. Pois diferentemente do que acham estado laico não é estado ateu.)

XII – Jamais se esquecer (ou se envergonhar) do que sonhava aos 20 anos de idade (Cara… Aos 20 eu já era casado e vivia numa fodástica sifudência pra ganhar a vida… Prefiro ter como padrão meus sonhos de adolescência!)

Estrogonofe sem censura

Desde o começo desse absurdo bélico entre Rússia e Ucrânia muita bobagem tem sido dita – principalmente pelos próprios meios de comunicação. O amigo virtual Jarbas Novelino, lá do Boteco Escola, em sua conta do Facebook fez uma avaliação cirúrgica, lembrando que a cobertura midiática dessa guerra é de “uma pobreza jornalística que dá dó”, principalmente pelo simples fato de que não há correspondentes in loco. Os assim chamados “correspondentes internacionais” não estão nem na Rússia, nem na Ucrânia, mas sim confortavelmente instalados em seus estúdios em Londres, Nova Iorque, Genebra ou seja lá onde for, limitando-se a ser mera caixa de ressonância dos veículos noticiosos mais encorpados.

Independentemente disso, temos ainda a questão de que, por discordar da atitude da Rússia, muitos países impuseram embargos, sanções e boicotes contra o país. E o que significa isso? São ações que visam, principalmente, afetar a economia interna, impondo situações que possam afetar tanto a importação quanto a exportação de produtos, bem como retaliações em outras esferas àqueles que coadunam com essa guerra.

Agora vamos ao desatino da coisa – que é, justamente, a especialidade deste nosso cantinho virtual: diversos restaurantes brasileiros, em “boicote econômico” à Rússia, resolveram tirar do cardápio o estrogonofe. Sério. Gente, cada vez mais acho que o FEBEAPÁ está fadado a se tornar eterno neste nesse Brasilzão véio sem portêra, pois em meio aos horrores de uma guerra este nosso povo resolve tomar uma atitude que não afeta em nada o que está acontecendo lá fora! Provavelmente só pelo afã de demonstrar que estariam “antenados” com o resto do mundo…

Ora, façam-me o favor!

Enfim, toda essa introdução serviu para resgatar um post lá de 31/10/2014 publicado pelo Daniel Rodrigues no (quase) finado Deitando o Gato na Grelha, um blog pra lá de bem-humorado que, segundo ele próprio, é de “Receitas de churrasco como ele tem que ser. Sem frescura e sem rodeios. Porque homem que é homem esquenta a barriga na churrasqueira e esfria na geladeira de cerveja.” E garanto-lhes que as receitas dele são ótimas!

Divirtam-se!

Strogonoff, uma pérola da culinária soviética

Sou um cara das antigas. No meu tempo, a Rússia era apenas uma província da URSS, que respondia pelo pomposo, vistoso e lustroso nome de União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Aliás, não respondia não, porque tinha uma tal guerra fria pegando, todo mundo com medo da bomba atômica, do MIG 29 (quem nunca assistiu Top Gun que atire o primeiro F-16), da estação MIR e da cadela Laika. E eles não respondiam nem pros Ianques, pra quem todo mundo respondia, então quem sou eu de falar que eles respondiam por alguma coisa…

Naquele tempo, os nossos camaradas, além de beber vodka, mandar foguete com cachorro pra lua e infernizar os americanos, se alimentavam alegremente com um delicioso prato que responde pelo nome de строганов.

Entendeu? O prato se chama строганов. строганов é uma coisa que se come. Não se fala, mas se come. A menos que você tenha feito parte da KGB num passado remoto (e se fez eu tenho medo de você), imagino que não consiga pronunciar o nome do prato. Cтроганов não é como feijão, arroz… Ou até mesmo Feijoada, que qualquer gringo sabe falar. Eles vão no boteco, falam “Feixoara” e o prato vem. Se eu ou você, ou nós dois juntos, formos à Rússia (prefiro chamar de União Soviética, mais charmoso) e pedirmos um строганов, ou ficamos com fome; ou levamos um cacete.

Imaginemos um tal de Sr. Dimitri Vladivostok (joguei muito War na adolescência).  Camarada Dimitri estava a largar a URSS querida e lançar-se ao mar rumo ao Brasil, como tantos fizeram nos tempos pós-segunda-guerra. Munido de toda a vodka que conseguia carregar, o Camarada Dimitri aportou nesta terra onde se plantando tudo dá, e começou sua pacata vidinha numa igualmente pacata cidadela deste nosso Brasil varonil. Solícito com os amigos e vizinhos, o simpático Camarada sempre convidava a todos a saborearem sua deliciosa строганов, receita cuidadosamente passada de mamuska em mamuska pela sua família, há séculos. E ninguém comparecia.

Rápido como uma Perestroika, Dimitri logo percebeu que as pessoas não iriam querer saborear um alimento do qual não entendiam uma única letra do nome. Ok, todos sabemos que строганов começa com C, mas essas línguas são muito loucas e de repente o C tem som de Y, ou de 9. Então ele colocou o Wladimir e o Mikhail Tico e o Teco pra funcionarem e numa bela tarde ao som de Raul Seixas… ele, que já passou pelos quatro cantos do mundo procurando, foi justamente num sonho, que ele lhe falou: STROGONOFF é a alcunha da sua oferenda, meu caro Dimitri.

Não seria nada incompreensível como строганов, não abandonaria as suas raízes bolcheviques, não lhe faria um traidor de Stalin, mas ao mesmo tempo era uma palavra que todo mundo  conseguiria pronunciar. Pois foi assim que o nosso destemido filho da Mãe Rússia saiu pelas ruas da pacata cidadela do nosso Brasil varonil gritando aos quatro ventos “Venham comer o meu Strogonoff!!!”. E foi um sucesso. Alguns estavam curiosos com o alimento, outros com pensamentos impuros em relação ao nosso camarada, mas como este estava com os cornos cheios de vodka, o resultado final é que todo mundo saiu feliz.

Agora vamos parar com essa enrolação e mãos à obra preparar essa verdadeira delícia da culinária Moskovita.

Por falar em Moskovita (R$6,90 aqui no Super Vizinho, mercadinho perto de casa), abra logo uma dose de vodka e façamos um brinde ao som das trombetas. Cantando comigo:

С помощью транслитератор из букв латинского алфавита получаются буквы кириллицы, иврита, белорусского, греческого, или украинского алфавитов. Этот транслитератор задумывался как сервис для русскоязычных жителей стран , находящихся за границей и желающих переписываться на родном языке. Если кто-нибудь говорит “Я пользуюсь транслитом”, то всем понятно – речь идет. Еще его называют просто

«транслит» или  желающих переписыват!!!
«транслит» или  желающих переписыват!!!
«транслит» или  желающих переписыват!!!
«транслит» или  желающих переписыват!!!

Cantou? Então bebe logo essa vodka e comecemos a nos embriagar com mais uma receita com o padrão de falta de qualidade Gato na Grelha:

A primeira coisa que você vai precisar é de um bom pedaço de carne e uma faca afiada. Mas que carne? Você pode preparar um strogonoff maneiro com vários tipos de carne (patinho, acém, alcatra…). Fuja das carnes muito gordurosas, que vão fazer do seu strogonoff um poço de banha, e fuja daquelas carnes que têm muita fibra, como o contra-filé. Na verdade, quem vai definir que tipo de carne você vai usar é o seu bolso. Patinho é barato, alcatra já nem tanto mas também não é uma fortuna, enfim. E como estamos falando do SEU bolso e não do meu, vou logo chutar o balde e te deixar cheio de carnê do açougue pra pagar: hoje vamos de filé-mignom, parceiro.

Sou muito fã desse corte. Eu e a torcida do curintia, do framengo e do parmera, né? É uma carne muito macia, muito saborosa, e que mantém o sabor e maciez mesmo sob condições extremas. E vamos colocar nossa carne sob condições marromeno extremas. Então é bom ela aguentar o tranco.

Nada disso de chegar no açougue e pedir aquele picadinho pronto pra strogonoff. Ali eles cortam do jeito que querem, pedações grandes, e você nunca vai saber se tem um filé de gato ali no meio. Então larga mão de preguiça e bora lá picotar nosso filé mignom. Pra nossa receita, uma peça de meio quilo já é o suficiente. Principalmente porque o FM (dá muito trabalho ficar digitando o tempo todo, então vamos chamá-lo de FM) é uma peça muito limpa, praticamente sem nervos ou gorduras, então você vai aproveitar praticamente 100% desse meio quilo.

Aí, merrmão.. o processo é o seguinte: afia a tua faca, concentra no que tá fazendo e picota a carninha até obter meio quilo de pequenos pedaços do tamanho de meio polenguinho. Teve infância, compana? Então você sabe do que eu tou falando. Picota mesmo, sem técnica, sem critério. Se você já esquartejou uma pessoa, saberá como fazê-lo. Se não esquartejou uma pessoa, também saberá. Foca na miopia e polengo na mente que você consegue.

Agora é hora de temperar o FM picado. Você ainda tem uma trabalheira pela frente, e aí a tua carne vai pegando gostinho do tempero, o que fatalmente vai se transformar em mais amor no teu prato.

ATENÇÃO: isso foi uma PIADA. JAMAIS coloque sazon num filé-mignon!!! Nem fora dele. Não gosto desses temperos de gultomato monossódico, não. Enfim, gosto pessoal. Se você quiser colocar sazon, coloca. Mas não me conta que a gente perde a amizade.

Você pode temperar o seu FM como quiser. Pelas experiências que eu já tive, recomendo apenas um pouquinho de uma pimenta tipo tabasco, pimenta do reino e sal.

Não recomendo usar temperos liquidos em abundância, porque você vai ter que fritar essa carne depois. Muito liquido pode miar a sua fritura e você acabar cozinhando a carne. Também não recomendo temperos com folhas. Uma vez eu usei orégano. O sabor até ficou legal, mas o orégano soltou da carne, obviamente, e ficou boiando pelo strogonoff, dando um aspecto meio esquisito. Nem pimentas em fruta, pelo mesmo motivo. Uma biquinha, por exemplo, vai ficar boiando no molho depois… Estranho. Vai de sal, pimenta do reino e tabasco que é sucesso.

Agora vai mexendo até o chão na boquinha da garrafa tudo aí e deixa o FM quietinho. Vamos à próxima.

Aproveita que a faca tá afiada, que você ainda tá sóbrio (eu acho) e que a animação tá te contagiando e tome mais uma dose de vodka picote uma cebola. Picota pequeno, compadre. Lembra sempre com essa sua cabeça de vento que você está fazendo um strogonoff de FILÉ MIGNON, e não um strogonoff de cebola. Pega duas panelas, e divide essa cebola picada em duas partes. Uma pra cada panela.

Aí o mais fino, elegante e sincero leitor desse blog me pergunta: “Mas por que duas panelas, meu caro escriba?”

E eu respondo: “Научиться пользоваться еще проще с помощью, наглядной!”, o que significa: “Para fazermos um belo e saboroso arroz branco, camarada!”. Mas aí surge um problema daqueles capazes de ruborizar o mais sem-vergonha dos leitores: Sim, eu sei fazer arroz. Sim, eu sei cozinhar coisas saborosas, elaboradas e elas costumam ficar deliciosas…. Menos o meu arroz. Meu arroz é péssimo. Em todos esses anos nessa indústria vital, eu nunca consegui fazer um arroz que não ficasse uma papa. Daqueles que você puxa um grão e vem a panela toda, sabe? Então. Por este motivo não tem nenhuma receita de arroz aqui no blog (tem algumas, mas tem migué. Lê que você vai entender). E por isso eu sempre pulo a confecção deste alimento nas minhas receitas. Assim como o farei novamente. Agora. Faça o arroz como quiser, ok?

Por favor, aceito dicas inbox.

Voltemos à panela do strogonoff, que é a única que nos interessa hoje. Aproveitando essa picotagem toda, picota bem pequeno E CUIDADO COM ESSE DEDO AÍ um dentinho de alho, daqueles que não são nem minúsculos, nem imensos. Nem o dente de leite do seu filho, nem o sabre do mamute. Você entendeu.

Vodka. Tome vodka. Se for balalaika, tome um pouco menos.

Tomate, chegou tua hora. Pode te preparar pra sofrer a mais desumana das torturas. Embora o tomate não seja humano. Mas ele é um vegetal que na verdade é uma fruta, e como tem muito humano que também é fruta, considero sim o tomate um humano e bora pra tortura.

Sabe tirar a pele do tomate? Não, você não vai descascá-lo como a uma laranja. Isso aí não tem a menor graça e a gente tá aqui pra ver tomate sofrer. Então pega uma panela, enche de água e bota pra ferver. Quando estiver a pino, jogue, sarcasticamente, o tomate lá dentro. Delicie-se com os seus gritos e súplicas de dor. Mas fica de olho, esses tomates são muito espertinhos e derretem rápido. E ainda vamos judiar um pouco mais. Tá de olho? A pele do tomate já fez algum rasgo? Isso mesmo, a pele do nosso prisioneiro vai abrir em algum ponto. Quando isso acontecer, tira ele da água quente. Agora olha que cruel: deita ele na sua tábua e vai arrancando cuidadosamente a pele, enquanto ele te conta toda a verdade. A pele se solta rapidinho e neste momento você terá um tomate sem pele. E sem vida.

Então pára de maldade, picota o tomatinho e guarda em cima da tábua mesmo.

Recapitulando:

1 – Picotamos uma linda peça de FM e temperamos. Ela tá em algum lugar da sua cozinha esperando por você. Pode ser em qualquer lugar, menos dentro da panela, ok?
2 – Picotamos meia cebola, esta sim está dentro da panela.
3 – Deixamos um alho banguela e o resultado está picotado dentro da panela.
4 – Temos um tomate sem pele, sem vida e sem dignidade picotado em cima da tábua.

Perfeito. Agora a coisa vai começar a cheirar bem…

Regue a cebola e o alho com azeite até cobrir o fundo da panela (tou acreditando que você pegou uma panela compatível com meio quilo de carne, certo?) e acenda, finalmente, o fogo debaixo dela.

O refogado é um dos momentos mais sublimes da culinária. Por isso, enquanto a cebola chia dentro da sua panela, tome mais uma vodkinha. Não sei você, mas eu já estou começando a ficar meio bebum. Bola pra frente.

Quando a cebolinha começar a ficar amarelinha, parecendo meio transparente, é a hora do FM entrar no jogo. Taca lá pra dentro todo o FM que você picotou. Dá uma mexidinha pra ele fritar legal.. Com o tempo, a carne vai começar a soltar um líquido e fazer daquilo um caldo com um cheiro delicioso. Pra saber se a carne tá no ponto… Tira uma e come, ué. A carne não pode estar mal-passada de jeito nenhum, porque a partir de agora, não vai mais ter fritura. Quando estiver no ponto, joga lá dentro o tomate. Dá uma mexidinha e deixa. O tomate tende a se dissolver, ou a ficar bem molinho.

Ah, esqueci de um cara importante: o Champignon. Sabe aqueles vidrinhos pequenos que vende no mercado, com campignon já picado? Então, taca um dele pra dentro. Se não estiver picado, pique. É importante ele ser pequeno. Só toma cuidado e não deixa aquela água da conserva cair dentro da sua carne. Ela é salgada e cheia de conservantes, vai estragar a receita. Cuidadaê!

Agora um toque que eu, particularmente, gosto muito: vai na geladeira, pega aquele catchup que você tem lá e manda uma golada de responsa pra dentro. É  mais ou menos a quantidade de catchup que você colocaria num X-Salada inteiro. Você vai saber o quanto.

Se você tem um catchup de qualidade na sua geladeira, tanto melhor. Se não tem, dá uma busca aqui no blog que tem uma receita maneiríssima de catchup da melhor qualidade.

Mexe. Tá ficando com um molho vermelhinho? É disso que eu tou falando, meu compana. Se você achar que o teu molho não tá lá muito vermelho, tá meio esquisito, pode jogar um pouco de molho de tomate pra ajudar. Imagina que você vai jogar uma lata inteira de um treco branco lá dentro, e o resultado final do strogonoff é uma cor meio laranja. Então bota essa palheta de cores pra funcionar e corrige o quanto julgar no molho.

Se você for daltônico, pensa que teu molho tem que estar com um azul bem maneiro, e o resultado final do strogonoff é um negócio meio amarelo-limão. Aí você pega aquele molho de tomate bem lilás que tem na sua geladeira e boa sorte aí pra ir corrigindo as cores. Enfim.

Mas que treco é esse que vamos colocar? É Creme de Leite, meu caro amigo… Aquele que sai do peitinho da vaca, que passou por um processo show de bola que eu não sei qual é, mas no final o que era pra ser comida de bezerro vira um treco bem cremosinho…

Só que você não pode simplesmente sair jogando creme de leite pelo mundo assim. Tem que tomar alguns cuidados antes. O creme de leite pode talhar com a temperatura, o fogo aceso, etc… Então desliga o fogo, joga o creme de leite lá dentro, mexe e pronto.

Tá feito o seu Strogonoff!

Emenda à Inicial: Acerca da “verdadeira origem” do prato, existem várias versões. A mais aceita é que teria origem por volta do ano de 1700 no seio (e vê se para de pensar bobagem aí!) da família Stroganov, uma rica família russa e de linhagem nobre. Os franceses teimam em afirmar que o prato não é russo, pois seria uma adaptação local de um prato deles – o que até faz sentido, afinal as famílias nobres russas costumavam ter um chef francês para servi-los.

Pois bem. Reza a lenda que o Conde Grigory Alexandrovich Stroganov – ou simplesmente ригорий Александрович Строганов – estava com problemas dentários e para que pudesse comer o chef do palácio adaptou o fricassé de carne (fricassé de boeuf), cortando em pequenas tiras e misturando a carne com um creme de leite tradicional russo. Tudo para facilitar a ingestão da comida. O acompanhamento era um caldo de legumes. Como foi feito para o Conde, o prato foi batizado com o nome da família.

Num livro de 1861 publicado por Elena Molokhoivets foi incluída uma receita de bife stroganoff com mostarda. Entretanto a receita original russa foi levada para a França pelo filho do Conde, Alexander, tendo sido publicada pelo chef Charles Brière por volta de 1891. O prato foi evoluindo e em 1912 Pelagia Alexandrova-Ignatieva acrescentou nova textura à receita, tendo incluído cogumelos, cebolas e molho de tomate, além de servir com batata cozida.

A Revolução Russa, de 1917, indiretamente exportou o prato para o exterior. E, na China, para onde alguns emigrantes nobres russos fugiram, o prato passou a ser servido com arroz – e foi essa “versão asiática” que foi adotada pelos americanos.

(Informações roubartilhadas daqui.)

Sobre história, estátuas e a pandemia

Muita celeuma tem se feito e a temperatura encontra-se agitada nas redes sociais por conta do que aconteceu com a estátua de Borba Gato.

Mas, antes de começar esse proseio, cá entre nós: vocês sabem quem foi Borba Gato?

Manuel de Borba Gato (*1649 +1718) foi um bandeirante paulista, descobridor de ouro e que exerceu o cargo de juiz ordinário em Sabará, MG. Participou da Guerra dos Emboabas (conflito pelo direito de exploração das então recém-descobertas jazidas de ouro onde hoje é o estado de Minas Gerais) e era genro do bandeirante Fernão Dias Pais Leme (conhecido como o “Caçador de Esmeraldas”). Percorreu com o sogro as matas de São Paulo e do Mato Grosso e, mais tarde, a região de Minas Gerais, tendo encontrado ouro no Rio das Velhas. Ascendeu ao posto de Tenente-general do Mato e foi responsável pela organização da justiça, divisão das lavras de ouro e do envio dos impostos que correspondiam à Coroa Portuguesa. Era muito estimado pelos governadores de São Paulo, pois entregou várias permissões para explorações de minas, datas e lavras a amigos e parentes.

Bandeirantes como Borba Gato, Fernão Dias e Raposo Tavares fazem parte da formação histórica da cidade e do estado de São Paulo, sendo que seus nomes até hoje batizam ruas, avenidas, estradas e possuem estátuas no Museu Paulista. Afinal, foi por causa das bandeiras que os limites do Tratado de Tordesilhas foram alargados e a América Portuguesa cresceu, obrigando os soberanos de Portugal e Espanha a assinarem outros tratados a fim de resolver as questões de limites entre suas colônias na América.

Entretanto os benefícios históricos não têm o condão de apagar os malefícios cometidos, eis que um dos objetivos dessas expedições denominadas “bandeiras” era também o de caçar indígenas e escravizá-los, sendo que, muitas vezes, aldeias inteiras eram dizimadas e seus habitantes dispersados para sempre (resumo histórico da professora de história Juliana Bezerra no site TodaMatéria).

Agora que vocês já sabem quem foi Borba Gato e qual sua representatividade na história do Brasil – tanto para o bem quanto para o mal – então já têm condições de avaliar por si próprios essa ocorrência com relação à estátua de 13 metros que lhe foi erigida em Santo Amaro, capital paulista, no início da década de sessenta. Na tarde deste último sábado, dia 24, atearam fogo na estátua e um grupo denominado Revolução Periférica assumiu a autoria do ato, o qual foi exaustivamente veiculado nas redes sociais. Não é necessariamente uma novidade, pois em 2008 um grupo de moradores da cidade questionou o valor da homenagem a um homem de virtude tão duvidosa e propôs eliminar o monumento; também em 2020 a estátua foi pichada, pois muitos consideravam que uma pessoa que causou tanto sofrimento aos indígenas não mereceria ter sua imagem exposta em via pública (informações da reportagem de Daniela Mercier, no jornal El País).

Diante desse quadro duas correntes se criaram: aquela que repudia o que foi feito por se tratar de depredação a um monumento histórico; e aquela que apoia o que foi feito por se tratar de uma espécie de justiça tardia em defesa aos povos indígenas.

Ambas as correntes têm meu respeito – desde que suas convicções tenham se formado a partir da análise dos elementos históricos e não por meras opiniões desvencilhadas de fundamentos (que é o motivo pelo qual fomos conduzidos ao buraco em que estamos).

Particularmente sou integrante da terceira corrente.

Sou a favor de discutirmos a existência e até a substituição de monumentos desse tipo, mas não de meramente derrubá-los, num ato de selvageria. Já temos tecnologia para adentrar o espaço sideral e ainda assim, após milhares de anos de evolução, ainda voltamos à barbárie, com nossas tochas, ancinhos e forcados para “combater o mal”. Mas que “mal” é esse? Apenas a mera imagem do mal, que há décadas estava exposta e agora, por mera conveniência, oportunidade ou vontade de aparecer mereceu ser combatido? Ora, façam-me o favor!

É como esse negócio de “rediscutir” as obras de literatura de antigamente, reescrevendo-as de acordo com o que hoje se julga politicamente correto. Os livros, pelas histórias e estórias que contam, por si só são o retrato de uma época. Esse retrato pode ser bonito ou não, mas não vai deixar de ser um retrato e o que aconteceu à época não vai deixar de existir só porque resolvemos contar de um jeito diferente. Se pararmos para pensar bem, essa questão das estátuas homenageando o que hoje julgamos facínoras é um bom exemplo pra isso: tentaram recontar a história e construíram monumentos para pessoas que, à época, eram “heróis” e “desbravadores”, mas que aos olhos de hoje não passariam de bandidos e exploradores da miséria humana.

É óbvio que Borba Gato destruiu nações inteiras ao longo dos mais de vinte anos que duraram suas bandeiras. Não tenho nem ideia de qual foi o número de indígenas massacrados e povos dizimados no decorrer desse período. Mas respondam-me com sinceridade: será que em algum momento durante esse período ele teria conseguido o “prodígio” de ser responsável, quer seja por sua ação ou omissão, pela morte de mais de meio milhão de pessoas em menos de um ano e meio?

Vocês querem discutir a derrubada de imagens de genocidas? Então sugiro que comecem a ler os jornais, assistir os noticiários e a acompanhar fontes confiáveis de informação. O principal genocida a ser derrubado não é o da imagem de décadas atrás, mas sim aquele que está confortavelmente sentado em sua cadeira levando nosso país à bancarrota. E, pior, se divertindo com isso. Fazendo troça e espalhando mentiras (“fake news” é muito chique, pois mentira é mentira, não importa o nome que se lhe dê).

Enfim, antes de se postarem como defensores ou indignados pelo que foi feito a uma mera escultura, sugiro que se questionem profundamente se já não passou da hora de retomarmos as rédeas de nossa nação, o que somente vai ter início se destituirmos aqueles que desejam o poder pelo poder, somente em benefício de si e dos seus, ignorando a gigantesca massa da população que a cada dia se vê numa situação pior, sendo paulatinamente dizimada, tal e qual o sofrimento impingindo pelos bandeirantes de antigamente.

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Agora que já conversamos com seriedade, vamos relaxar, pois este aqui é um blog que continua tentando trazer algum entretenimento para vocês. A respeito dos bandeirantes uma de minhas tirinhas preferidas foi feita por Laerte, na edição nº 1 da revista Piratas do Tietê, em 1990, quando ao chegar nessas paragens paulistanas quem foi que eles encontraram? O Capitão e sua tripulação, é claro! E cá entre nós, adorei a “negociação”! 😀

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Mas melhor ainda foi a estória contada também pela Laerte e publicada na edição nº 12 da revista Piratas do Tietê, em 1992, sob o título “Bandeirantes do Pinheiros”, onde, com muito bom humor – e um tanto mais de sarcasmo – ela nos conta como foi que se deram as bandeiras através dos tempos. Confiram!

Moral conservadora: perguntas que podem revelar a hipocrisia

J. C. Guimarães

Costumes conservadores são baseados na ideia de família tradicional, homem e mulher, com nuclearidade na figura masculina; na monogamia; na heteronormatividade, combinando os dois sexos opostos; no judaísmo-cristianismo enquanto sistema de crenças transcendentais (do qual a Bíblia seria o código), com forte componente racial de superioridade dos brancos. Têm sido a ideologia hegemônica no Brasil desde os tempos coloniais, quando aqui teve início a exploração econômica, sexual e racial de nativos e africanos, pelos conquistadores portugueses. São a ideologia do governo atual porque são, também, a ideologia das classes dominantes e, até, das classes dominadas, que, reconhecidamente, tendem a reproduzir convicções estranhas aos seus interesses.

Não é preciso valer-se dos conceitos clássicos (de Morgan, Mauss, Malinowski etc.) para saber que essas representações mentais são estruturantes em sistemas culturais complexos. Legítimas, têm a função de dar significado e coesão a grupos que nelas se reconhecem. Sem elas, perdem-se as referências que mantêm a noção de ordem, fundamental para a manutenção cósmica. São, nesse sentido, verdadeiros nortes existenciais, em que se baseiam o equilíbrio comunitário e individual. Daí a violenta reação a tudo que ameaça o conservadorismo, como aqueles grupos em ebulição — as chamadas “minorias” — aos quais se contrapõe. Conviver com as diferenças não é fácil, pela simples razão de que todos os grupos humanos buscam não apenas a própria identidade e afirmação, mas também a universalização de seus valores. É a hegemonia que está em jogo e o temor de extinção de uns pelos outros, o que tenciona o conjunto social e leva ao confronto aberto. A sociedade brasileira chegou a esse estado de polarização, a partir de 2015. Desde então, costumes e valores viraram guerra declarada.

Convém perguntar: os tabus conservadores são integralmente levados a sério por seus aderentes? Analisados ponto a ponto, será verdade que os conservadores são fiéis ao conservadorismo? Serão eles, na vida privada, leais seguidores das normas de conduta publicamente exortadas e defendidas? Talvez nos decepcionemos ao entrar sorrateiramente nesta “honrada” casa, onde, ao que parece, nem tudo deve ser tão harmonioso. Pode ser que aquele elenco de ideias do início desse artigo seja ilusório — de fato, apenas ideologia —, falseando práticas comportamentais contraditórias que o desmentiriam, em parte ou no todo. Estudos antropológicos e sociológicos poderiam, com mais eficácia, revelar a imensa hipocrisia que nós, enquanto observadores, suspeitamos existir por entre as quatro paredes dessa casa. Uma série de questões bastante polêmicas se impõe, aos seus moradores.

O patriarcalismo apoia-se, inclusive, no Novo Testamento, e boa parte das mulheres aprecia a ideia de submissão a seus maridos. Mas em que porcentagem isso é escolha livre delas e não produto de repressão? É verdade que os casais, nas famílias tradicionais, estão mutuamente seguros da fidelidade dos seus parceiros? A monogamia é um fato social no Brasil. Significa que a fidelidade é, de fato, observada pelos conservadores ou a traição é mais comum do que se admite, entre eles? E, tendo em vista a traição, as esposas conservadoras têm a mesma chancela social que os maridos, para “pularem a cerca”? Elas estariam de acordo com uma provável desigualdade de tratamento? Casais conservadores restringem, realmente, suas relações sexuais entre marido e mulher ou, além de eventualmente se traírem, transgridem de forma associada, buscando práticas “corruptas” como o swing? Nesses jogos eróticos as trocas são entre sexos diferentes ou, eventualmente, ocorrem manifestações homoeróticas?

A homossexualidade é, de fato, raríssima ou comum entre os conservadores, incluindo seus líderes? Tudo isso não é nada conservador e levanta sérias questões morais, nos termos da moralidade que pretende se impor ao Brasil. Mas precisa ser respondido pelos conservadores, a fim de se estabelecer a coerência entre seu discurso e sua prática. Pública, inclusive.

Opções de arranjo familiar e escolhas sexuais interessam à religião, mas nunca foram agenda para o Estado laico, praticamente único no Ocidente e no Brasil. Somente em países comunistas, como a Coreia do Norte, e teocráticos, como o Irã, o governo controla a vida privada dos cidadãos. Agora, o governo brasileiro, que vocifera contra o Comunismo — regime “autoritário”, que “acabaria com a liberdade das pessoas”, e por isso “é preciso armá-las” — é o mesmo governo que se infiltra nas casas dos brasileiros para impor a visão de mundo de um grupo: os conservadores. Não precisamos, então, temer os comunistas, pois a principal missão da extrema-direita é, justamente, violar nossos muros para acabar com nossa liberdade. Pensando bem, aqui não há contradição, porque apenas comprova seu próprio autoritarismo, fascista. O que será contraditório é se, ao avançarmos das instituições públicas para os recintos domésticos desses novos moralistas, descobrirmos práticas que não recomendam. Será que não temem responder às perguntas mencionadas acima, expondo-se a um grave problema moral: a hipocrisia?

O conservadorismo, enquanto fenômeno público, é bem conhecido e assentado. Um estudo íntimo dele, porém, poderia surpreender a todos nós. E até escandalizar os menos liberais.