A mulher que fuma

Meu bom (e sumido) amigo Zé Luiz já tratou desse tema lá na Lente do Zé, com seu ótimo texto sobre A Dama de Vermelho – rememorando os áureos tempos do Villagio Café…

Mas esse assunto me veio à mente logo após ler um texto do Mário Prata – pra variar, muit0 bom.

Fui levado a uma recente época em que ainda não tínhamos esse cerceamento que hoje vivemos, esse vigilantismo hipócrita das brigadas do “politicamente correto”.

Naqueles dias sentávamos num bar qualquer, um cinzeiro à mesa, um garçom atento, uma boa bebida, suave música ao fundo, um bom proseio, sorrisos, um excesso em charme e aquele ar meio noir que pairava em ambientes assim. Às vezes uma carona até em casa, um trecho de rodovia, um tempinho para nós, “acende pra mim?” – eu dirigia, “claro!” – me respondia, e a cor e o sabor de seu batom se misturavam às minhas tragadas pela estrada…
 
A mulher que fuma

Mário Prata
JAN/2002

A mulher que fuma é, antes de mais nada, sexy.

Se você for mulher e não fuma, não pense que estou defendendo o cigarro. Não. Estou defendendo a mulher que fuma cigarros. É completamente diferente.

Sim, porque homem fumar pode ser até um ato machista. O mundo inteiro fazendo campanha contra a nicotina e o homem lá, todo macho: fumo mesmo, e daí?

Já a mulher, não. É um dos prazeres do cotidiano dela. Não quer agredir ninguém nem burlar nenhuma lei. Nem feminista é. É feminina e como. O cigarro se incorpora ao seu corpo, suas curvas.

Siga o movimento do braço dela até perto da boca para levar o cigarro, num ritmo que só ela tem. A mão fechada e dois dedos em linha reta, hirtos, que vão se abrindo lentamente até chegar perto do cigarro. Admire a tragada, que faz com que seus lábios participem de um movimento no mínimo excitante. O puxar da fumaça para os pulmões faz com que seus seios se ergam magicamente uns dois centímetros. E, para completar, ainda passa a língua, descaradamente pelos lábios.

Depois solta a fumaça fazendo um biquinho muito do comprometedor, como se estivesse assoviando para a gente. E, com uma leve inclinada do pescoço, fica observando a fumaça virar ar.

Agora observe o seu dedo indicador batendo a cinza no cinzeiro. E, se ela deixa o cigarro descansando ali, não sei por qual fenômeno da natureza, a fumaça sobe retinha e lá em cima, depois de mais de um metro, serpenteia como a gingada de uma baiana de corpo delgado. E se você olha para o filtro vê a marca de um batom que poderia estar – quem sabe – nos nossos lábios.

E não pense que ela apaga o cigarro dando porradas nele. Não. Ela passa a bituca de um lado do outro do cinzeiro, sem pressa, como se estivesse pincelando alguma coisa.

Deviam proibir o cigarro só para os homens. Que teriam o prazer do cigarro apenas na boca da mulher amada. Pra que mais?

Uma Noite no Museu

Muito bom!

Pra quem não conhece, explico.

Toda sexta-feira de lua cheia a Fundação Cultural de Jacarehy faz a apresentação de “Uma Noite no Museu”. Resgata algum contador para contar causos do folclore da região lá no Museu de Antropologia (um casarão da época do café fantasticabulosamente maravilhoso!). Nessas sessões que ocorrem às oito e às dez da noite (para dar um clima) descortinam-se diversas lendas e estórias (histórias?) de fantasmas, sacis, almas penadas e por aí afora…

E, desta vez, o contador era o Moacyr Pinto, figura conhecida, sociólogo e pesquisador, que nos trouxe “a sabedoria e os causos do seu Zé Pedro, Mestre quilombola da Casa de Farinha de Ubatuba”. Mas, melhor: para acompanhar o fim de cada causo, uma música sobre o que acabou de ser contado, cantada em verso e prosa pelo amigo Deo Lopes (o da viola) mais o Cauíque (o da sanfona).

Casa lotada (o que teve de gente que sentou no chão…), um bom lugar no cantinho da primeira fila e mais hora e meia de proseio. Desfilaram ali em nosso imaginário a macaca Catarina e a Sexta-Feira da Paixão, a traidora cobra avessa à filosofia de que o bem se paga com o bem, aquele que andou por seis horas num só dia, o caiçara que convidou a Morte como madrinha, a certeza de que dinheiro não é mais que gente, o desafio e muito mais. No dedilhado do Deo, então… Realmente muito bom!

E, é lógico, após cada sessão, o público já sai convidado para um café ou chá (de camomila) com direito a biscoito de polvilho e bolo de fubá…