Estelionato religioso

Sob o título de “O milagre não veio – Igreja tem de devolver doação a fiel arrependido”, de autoria de Fernando Porfírio, eis mais uma saborosa notícia de nosso mundo jurídico…

A Justiça condenou a Igreja Universal do Reino de Deus a devolver R$ 2 mil, acrescidos de juros e correção monetária, desde janeiro de 1999, para um fiel arrependido da doação. A decisão, inédita, é da 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo. Os desembargadores entenderam que o motorista L.R.S. foi induzido a erro, com a promessa de que se entregasse o dinheiro à igreja sua vida iria melhorar.

“O aconselhamento acabou por induzir o apelante, que vinha a sofrer algum tipo de influência, a praticar ato por ele efetivamente não desejado”, decidiu o relator, desembargador J.R.. Para o desembargador, a conduta esperada pela sociedade por parte de alguém que se denomina pastor, seria aquela de orientação espiritual.

O caso de L.R.S. , hoje com 27 anos, começou em 1º de janeiro de 1999, quando foi abordado por um pastor da Igreja Universal do Reino de Deus. O pastor, de nome M., convenceu L.R.S. a se desfazer de seus bens materiais e entregar o que arrecadou para a Universal. O motorista caiu na conversa e foi lá vender seu único bem, um Del Rey. Conseguiu R$ 2,6 mil e entregou tudo ao pastor. O sacrifício estava feito, faltava a recompensa.

Dias depois, L.R.S. se arrependeu percebendo que foi vítima da fragilidade e do desespero por conta das dificuldades financeiras. Correu ao banco e conseguiu sustar um dos cheques (de R$600,00) que entregara ao pastor. A mesma sorte não teve com o segundo, de R$ 2 mil. Alegando ser vítima de gozações e chacotas, o motorista entrou com ação de indenização por danos morais e materiais.

Em primeira instância a Justiça não reconheceu o direito de L.R.S. de ter o dinheiro de volta. O juiz C.E.L.F., da 1ª Vara de General Salgado (município localizado a 556 quilômetros da capital paulista), entendeu que o motorista não provou que passou por transtornos financeiros, nem que a doação teria ocorrido por força de erro ou por culpa do pastor da Igreja Universal.

O motorista bateu às portas do Tribunal de Justiça paulista contestando a sentença. Afirmou que ficou comprovado no processo que a suposta doação não foi espontânea, mas induzida pela promessa de dias de melhoria financeira feita pelo pastor da Universal.

O relator, desembargador J.R., destacou, ainda, que não se justifica enriquecimento sem causa de uma parte em desfavor da outra. “A indução do autor em erro se revelou manifesta no caso, quer pelas condições em que se deu, quer pela extensão do risco a que se expôs”, completou.

O desembargador C.T.L., um dos julgadores do recurso, argumentou que se a preocupação da Igreja era a de dar início a uma nova fase na vida do fiel, com a melhora da sua precária situação econômica, melhor seria que a Universal devolvesse logo o dinheiro por conta do arrependimento de L.R.S..

A 4ª Câmara de Direito Privado, no entanto, não acolheu o pedido de L.R.S. na parte que reclamava indenização por danos morais. Para os desembargadores, o motorista não conseguiu provas que por conta do caso sofreu chacotas e gozações. “Determinadas condutas acabam necessariamente virando causa de comentários”, afirmou o relator.

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