O passado bate à porta (II)

Irmãs Cajazeira1948. Seu Bento (vulgo Meu Pai) tinha, então, apenas onze anos de idade e veio do interior de Minas, juntamente com toda sua família, de trem, para o Vale do Paraíba, em São Paulo, onde seu pai (vulgo Meu Avô) resolveu tentar nova vida. Instalaram-se na zona rural de São José dos Campos, a família cresceu, fizeram amigos, conheceram o povo em geral. Pouco mais de dez anos depois seu Bento casou-se com Dona Dete (vulgo Minha Mãe) e instalaram-se na mesma cidade, no bairro de Santana (também conhecido como estância hidromineral – muita água em baixo e mais mineiro ainda em cima). Repetiu-se o ciclo, tiveram seus filhos e também eu nasci, sem saber que num futuro não muito distante teria a aparência física tão semelhante à de meu pai.

1988. Um ano que começou quente e abafado, com chuvas tão ligeiras que mal era possível se refrescar. Eu (vulgo Eu mesmo) havia me casado há pouco tempo e estava de mudança para uma casa nova, ainda em reforma, em Santana. Bairro antigo na cidade, onde a maioria dos moradores já remontava a outras épocas. Dentre estes, estavam as chamadas “Irmãs Cajazeira”. Quem se lembrar da antiga série “O Bem Amado”, com Odorico Paraguaçu, Zeca Diabo e outros personagens pra lá de caricatos também vai se lembrar dessas moçoilas.

Na vida real, lá em Santana, tratavam-se de três irmãs já idosas e solteironas convictas que moraram juntas a vida toda. Minha nova residência ficava a apenas algumas dezenas de metros da casa delas e, na época eu ainda não sabia, elas foram amigas de minha família e conheciam meu pai de longa data. Naquele entra e sai de mudança, organizando tudo, eu e a falecida (vulgo ex-esposa) estávamos a todo momento na calçada, sob a vistoria intrépida daquelas senhoras que tinham por missão particular de vida fiscalizar toda a vizinhança. E eis que entre elas surge o conversê (cujo teor só fiquei sabendo por elas mesmas, anos depois):

– Olha lá, vizinhos novos!

– Hmmm, parece casalzinho recém-casado…

– Já têm filho? Alguém viu algum bebê por ali?

– Não, não parece que têm não. Mas aquele rapaz ali até que é bem familiar, não é não?

– Agora que você falou, é sim. Quem será?

– Ah, não acredito que vocês não se lembram! É o Bentinho!

– Será?

– Ah, não pode ser!

– É sim!

– Mas tirou o bigode.

– E tá bem, não tá não?

– Tá sim. Bonitão, como sempre… E casado com aquela mocinha!

– Menininha de tudo!

– E a Detinha?

– Não sei não.

– Deve ter desquitado…

– Pouca vergonha.

– Puxa vida, mas que coisa. Como será que ele conseguiu ficar assim tão bem conservado – tanto que até casou de novo – e nós três aqui, ACABADAS!…

0 thoughts on “O passado bate à porta (II)

  1. Adauto, sem querer achei esta pagina, e já dei muita risada. Vc é uma comédia. Estou com saudades…. Dá um abração no tio Bento e na Tia Bernadete. Um Beijo no Adilson, um pra você e um na boca do Anselmo rsrsrsrsrs.
    Saudades de montão… Me escreve e vem aqui nos visitar… Bjox

  2. Fala, prima!!! Tudo bão? “Fazemos o que podemos”… Obrigado pelo beijo! Pódeixá que darei o abração no pai, na mãe, no Adilson e… bom… darei o recado pro Anselmo, tá?
    Essa visita eu tô devendo faz tempo… Ainda hei de conseguir!
    E volte sempre! Quem sabe você ainda acha mais um ou outro causo interessante por aqui…

    Beijão! 😉

  3. “Desculpa”? “DESCULPA”??? Vai pro milho! Ajoelhada sobre o milho durante duas horas. Talvez seja o suficiente…

    Xapralá, zifia! Continuo distribuindo os abraços e beijos que você mandou (exceto aquele do Anselmo).

    Inté!

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