Da propaganda enganosa

Jean

Hoje eu acordei com um pontapé bem no meio do queixo – ôôôôô maneira desgraçada de acordar!

Não, não, não.

Não foi briga, não.

Foi meu caçula, de dois anos e quatro meses, o Jean. Pra variar, ele foi pra nossa cama no decorrer da noite e acomodou-se em seu lugar predileto: atravessado, sobre nossas cabeças. Como ele costuma se mexer muito durante o sono… bem, foi dali que veio o malfadado pontapé!

Isso me levou a algumas elucubrações mentais logo pela manhã…

Sabe aquele momento, entre o “acabar-de-acordar” e o “criar-coragem-pra-sair-da-cama”? Perguntei pra mim mesmo: “Mim mesmo, por que cargas d’água esse bandidinho veio parar aqui? Será que foi o frio? Afinal ele se mexe MUITO quando dorme (nesse momento levei a mão ao queixo, massageando-o…) Será que fez xixi? Mas eu troquei a fralda de madrugada – tinha cerca de meia tonelada de xixi e ele ainda deveria estar sequinho…”

Foi quando comecei a pensar nas propagandas de fraldas, onde mostram aquela mulher sorridente despejando um jarro d’água numa fralda, mostrando suas vantagens, e como a camada de seu exclusivíssimo hiper super ultra mega blaster ômega avant plus gel especial, deixa o bebê sequinho.

Pois bem, deixe-me acabar com a ilusão de vocês: aquilo não é verdade! Bem, pelo menos não corresponde exatamente à realidade. Seria mais correto se ela despejasse seguidamente umas três jarras de água na fralda, até que ela atingisse a forma e consistência de um daqueles ursos de pelúcia gigantes que costumam dar como brinde se você vender algumas rifas até o final.

Além disso, por mais “noturna” que sejam, as fraldas não vêm com um sistema automático distribuidor de cremes anti-assadura (leia-se Hipoglós), pois nos casos de excesso as dobrinhas do pequerrucho sempre acabam ficando ardidas.

Ah! E esqueceram do show de contorcionismo. Não, zelosa mãe, cauteloso pai, aquelas crianças comportadas e sorridentes que aparecem nas propagandas não podem ser reais (robôs animatrônicos, talvez?), pois a probabilidade de que fiquem calminhos numa troca de fraldas é inversamente proporcional à pressa ou sono que você tiver no momento. Lembro-me de ter lido certa vez que uma boa maneira de treinar como vestir bebês, seria tentar colocar uma blusinha num polvo. Vivo. Não adianta ter acabado de acordar, ou de tomar banho, ou até mesmo de dormir. ELES. NÃO. SOSSEGAM! Acerta a fralda, eles viram. Gruda um lado, descola outro. Põe um pé, o outro sai. E a coluna vai pro espaço.

E o choro? Pois é, invariavelmente eles choram. E isso os comerciais também não mostram. Os irmãos que acabaram de dormir começam a se mexer na cama, e o bichinho, lá, chorando. Você já trocou a fralda, trocou a blusa, trocou a calça, e o bichinho, lá, chorando. Fez “SHHHH!”, embalou, acalentou, e o bichinho, lá, chorando. Deu chupeta (que caiu de lado, pela boca aberta), e o bichinho, lá, chorando. Nessas horas, não adianta: a única coisa que resolve é o “ursinho de estimação” com o qual ele adora dormir agarradinho. Ou seja, a mãe.

Há algum tempo existia ainda um outro tipo de problema: haviam dois tipos de adesivos para fechar as fraldas: o que jamais gruda e o que não solta nunca mais. Ao menos esse foi resolvido pela indústria fraldífera…

Por fim, restaria solucionar o derradeiro problema – que, inclusive, deu azo a esse texto: que raio de teletransportador hiperdimensional já vem embutido nos bebês? Quando, finalmente, superados todos os obstáculos, você o coloca no berço – e ainda prende a respiração no momento em que ele dá uma viradinha e uma resmungadinha aconchegando-se – e você volta, guerreiro, cansado, perto do limite da exaustão, para sua cama, aninhando-se no braço de sua amada, começando a cochilar, a dormitar, sentindo-se envolvido numa inebriante onda de cansaço… eis que do nada você sente uma presença estranha na cama, pois ele se materializou entre vocês, e ainda dormindo, deu-lhe um respeitável pontapé no queixo.

Pois é, gente. As agências de publicidade não colocam nada disso nos anúncios de fralda…